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DIAS DA MULHER: Ruth de Souza foi a primeira atriz negra a atuar no Municipal
do Rio
Date:
07/03/2017
“Riam de mim
quando eu dizia que queria ser atriz.” Estas foram as palavras usadas por Ruth
de Souza, a primeira atriz negra a encenar no Theatro Municipal do Rio, ao
contar sua história de enfrentamento ao racismo durante a infância, na série
“Damas da TV”, exibida pelo canal pago Globonews, em 2014.
Por Luiz
Carlos Ferreira Do Folha de São Paulo
No programa, a atriz, hoje
com 96 anos e cerca de uma centena de atuações no teatro, TV e cinema, contou
que no primeiro ano de escola foi às lagrimas ao ver em seu livro escolar
um capítulo sugerindo que o formato da cabeça do negro fazia com que ele fosse
intelectualmente inferior aos demais seres humanos.
Primogênita
de dois irmãos, Ruth Pinto de Souza nasceu no Engenho de Dentro (Rio), em 12 de
maio de 1921. Mudou-se ainda pequena com a família para um sítio no município
de Porto Marinho, interior do Estado de Minas, onde seus pais dependiam da roça
para a sobrevivência da família.
Aos nove anos, com a morte do
pai, retorna com a mãe e os irmãos para o Rio, onde passam a viver em uma vila
de lavadeiras e jardineiros, em Copacabana.
O DESPERTAR PARA A SÉTIMA
ARTE
A paixão pelo cinema surgiu na
infância, depois de assistir ao filme “Tarzan, o Filho da Selva” (1932). Desde
então trabalhar no cinema passou a ser o seu maior propósito de vida.
Anos mais tarde, na juventude,
folheando a Revista Rio -do jornalista Roberto Marinho-, a atriz leu uma
reportagem sobre um grupo de jovens atores negros que se reunia no Teatro do
Estudante do Brasil (TEB), no Rio. Era o embrião do Teatro Experimental do
Negro (TEN), fundado em 1944 pelo ator, professor, político e ativista negro
Abdias do Nascimento e fundamental para a valorização do artista negro no país.
Na noite
de 8 de maio de 1945, como integrante do TEN, Ruth de Souza entra para a
história ao ser a primeira atriz negra a encenar no palco do tão prestigiado e
elitista Theatro Municipal do Rio de Janeiro, com o espetáculo “O Imperador
Jones” [“The Imperator Jones”], do dramaturgo americano Eugene O’Neill (1888-1953).
Em 1947, ainda fazendo parte do
grupo teatral de Abdias, a atriz participa da montagem “O Filho Pródigo”, de
Lúcio Cardoso (1912-1968), quando recebe o prêmio de atriz revelação do ano.
A estreia no cinema
aconteceu em 1948, por indicação de Jorge Amado (1912-2001), quando a
atriz fora escalada junto com os já consagrados Grande Otelo (1915-1993) e
Anselmo Duarte (1920-2009) para o elenco de “Terra Violenta”, uma adaptação da
obra do escritor baiano produzida pela Atlântida Cinematográfica.
ESTÁGIO NOS EUA
O ano de 1950 foi um dos mais
memoráveis para a atriz. Com a mão do teatrólogo e diplomata Paschoal Carlos
Magno (1906-1980), Ruth de Souza foi agraciada com uma bolsa de estudos cedida
pela Rockefeller Foundation, para cursar um ano de teatro e cinema nos EUA.
Em Cleveland, no Estado de Ohio,
além de atuar em peças, trabalhou como contra regra, assistente de direção e
diretora de palco. Em sua passagem por Nova York, fez estágio na Academia
Nacional de Cinema Americano e, depois, na Universidade Harvard, em Cambridge.
O RETORNO AO BRASIL
De volta ao país, e com a
ajuda do diretor Alberto Cavalcanti (1897-1982), tornou-se uma das
primeiras atrizes contratadas pela recém-criada Vera Cruz, onde participou de
cinco produções.
No filme “Sinhá Moça” (1953),
como coadjuvante, foi indicada ao prêmio de melhor atriz no Festival de Veneza,
concorrendo com as internacionais Katharine Hepburn (1907-2003), Michèle Morgan
(1920-2016) e a vencedora Lilli Palmer (1914-1986), para quem perdeu o prêmio
por pouca diferença.
Com a
chegada da TV no Brasil, em 1950, Ruth passou a fazer teleteatros na pioneira
Tupi, onde já se apresentava em musicais. No decorrer da década atuou nos
filmes “Candinho” (1954) -ao lado de Mazzaroppi-, “Ravina” (1958), “Favela”
(1960) e “Assalto ao Trem Pagador” (1962), entre outros.
Conciliando cinema, televisão e
teatro, atuou nas peças “Vestido de Noiva” (1958), “Oração para uma Negra”
(1959) e “Quarto de Despejo” (1961), onde interpreta a escritora Carolina Maria
de Jesus (1914-1977), moradora da favela do Canindé, na zona norte de São
Paulo.
NA TELEDRAMATURGIA
A primeira telenovela veio em
1965, em “A Deusa Vencida”, na TV Excelsior. Três anos depois, em 1968, estreia
na TV Globo com a trama “Passo dos Ventos”, onde interpretou uma mãe de santo,
e, em 1969, torna-se a primeira protagonista negra na novela “A Cabana do Pai
Tomás”, onde trabalhou ao lado do amigo e ator Sérgio Cardoso (1925-1972).
Na Globo, onde é contratada há
quase 50 anos, fez mais de 30 novelas. Entre as de maior destaque estão “O Bem-Amado”
(1973), “Helena” (1975), “Sinhá Moça” –1ª e 2ª versão (1986/2006)– e “Memorial
de Maria Moura” (1994). A minissérie “Na Forma da Lei” (2010), foi a sua última
atuação na emissora desde então.
Seus
trabalhos mais recentes no cinema foram em “O Vendedor de Pássaros” (2015) e em
“As Filhas do Vento” (2005).
Perseguida pelo racismo, Ruth de
Souza costuma dizer em entrevistas que sempre teve que brigar muito por bons
papeis ao longo de seus mais de 70 anos de interpretações. Mas agradece
constantemente aos autores Janete Clair (1925-1983) e Dias Gomes (1922-1999)
pela possibilidade que proporcionaram a ela de representar personagens de maior
relevância na TV.
Em 2016, Ruth de Souza foi
homenageada na mostra “Pérola Negra”, que ficou em cartaz no CCBB de Brasília e
de São Paulo, onde foram exibidos 25 de seus trabalhos mais marcantes.
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