Seppir,
PT, o movimento negro e a crise
Publicado
há 5 dias - em 21 de dezembro de 2015 » Atualizado às 12:22
Categoria » Questão Racial
Categoria » Questão Racial
No dia
02/10/2015, a já esperada reforma administrativa foi anunciada pela presidenta Dilma Russef. A partir da unificação entre a
Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), a Secretaria de Políticas de
Promoção da Igualdade Racial (Seppir) e a Secretaria de Direitos Humanos (SDH),
formou-se o Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos. Como
resposta a crise, a politica de enxugar os gastos do governo não por um acaso
esbarra na SEPPIR.
Por Marcela Johnson, do Alma Preta enviado
para o Portal Geledés
A relação do Partido dos
Trabalhadores com o movimento negro e com uma estratégia de combater seriamente
o racismo, mostra sua verdadeira faceta já nos primeiros ajustes governamentais
diante da crise. A pergunta é, o que iremos fazer a partir dessa experiência de
12 anos de PT no governo e de suas políticas para negros e negras no país?
Criada há 12 anos, no inicio do
governo petista, a Secretária foi fruto de uma longa luta dentro e fora do
partido. Enquanto o entrave seguiu e segue até os dias de hoje, a SEPPIR
se tornara em um mecanismo de cooptação e de desorganização do próprio
movimento negro, na medida em que o amarra ao Estado e que tenta “acalmar” sua
luta independente, a partir dos seus métodos históricos.
Primeiramente, é importante
colocar que o movimento negro, desde a
Frente Negra Brasileira, entendeu a importância da sua participação no Estado.
Como esse movimento nunca foi homogêneo, a própria ideia de se inserir no
Estado tinha ligação com diversas estratégias de diferentes setores.
Se pensarmos na própria história
do PT, onde setores do Movimento Negro confluíram com o movimento operário,
estudantil e acadêmico, poderemos perceber que só através das lutas que se
estendem desde sua criação foi possível, em 2002, a primeira elaboração de um
programa para a presidência que tratava da questão negra, “Caderno – Programa Brasil Sem Racismo”.
Apesar do partido sempre ter sido
parte da luta contra o racismo, principalmente a partir da sua militância
negra, muitos foram aqueles que apontaram na história do PT a questão negra como
secundarizada.
Mas o PT, assim como negros e
negras ligados à organização, já apontam no programa partidário e na prática
que uma saída para o problema racial no Brasil não é viável sem o fim das bases
do racismo e sem a superação dos problemas fundamentais de todos os
oprimidos no país. A estratégia petista, antes de se tornar o representante do
governo, já era insuficiente para os negros e para a classe operária. Essa
organização se coloca, então, como uma barreira para o avanço na luta
antirracista.
Pois bem, com a eleição de Lula,
em 2003, uma parcela importante do movimento negro entrou no aparato estatal
(como ministros, nos conselhos e etc) e assim se deu a tentativa de enegrecer a
cara das politicas do governo. É importante ressaltar que a incorporação de
negros nos governos não foi uma novidade desse período, mas vem de um processo
anterior desde a democratização, quando os governos vão de alguma forma abrindo
canais de dialogo com o Movimento Negro, como forma de tentar, principalmente,
cooptar as suas lideranças.
A partir de Lula essa política só
se expande. Boa parte dos quadros do movimento negro vão para dentro de seu
governo, fato que desarticula muitas das lutas anti racistas. A força do então
presidente faz com que o movimento “passe um pano” para uma administração que
esconde atrás de politicas assistencialistas a sua ligação com a classe
dominante, a grande responsável pela miséria de negros e negras e que apareceu
no ultimo período presidencial como “o mal menor”.
Se por um lado essa integração é
parte da exigência de setores do movimento negro, inclusive a possibilidade de
ter um órgão especifico nacional que pense, elabore e acompanhe políticas
contra o racismo como forma de potencializar a luta pelas pautas negras, por
outro, essa integração é parte de um processo que gera desorganização e
enfraquecimento do próprio movimento. Mas como assim?
Precisamos pensar em que contexto
existe a SEPPIR. A sua ligação e a sua dependência ao governo geram uma relação
em que, se por um lado a SEPPIR deveria responder aos anseios dos negros
brasileiros, expressos principalmente pelas pautas do movimento negro, por
outro, há uma grande pressão (quase uma imposição) em seguir a politica do
partido da ordem, afinal o presidente não colocaria na direção dessa secretária
alguém que contrariasse as suas políticas centrais.
Essa situação, onde a pressão do
governo é muito maior do que a do movimento social, faz com que essa secretária
assuma um posto de defensora da política demagógica e restrita do governo. Para
isso, a SEPPIR contém os anseios do movimento negro com as pequenas negociações
e concessões que a administração permite.
O problema central não está no
fato de negros entrarem nos governos, mas como eles entram, com que proposição,
com qual relação com as lutas e demandas reais. Sem a luta real, é impossível
avançar.
A então nomeada chefe do novo
ministério, Nilma Lino Gomes, em sua primeira aparição, falou sobre a mudança
dos ministérios e muito ilustrou o que acima escrevi. Enquanto vários setores
do movimento negro diziam não ao rebaixamento da SEPPIR e sua unificação
(“NENHUM DIREITO A MENOS, DEMOCRACIA SE FAZ COM DIÁLOGO E PARTICIPAÇÃO”), Nilma
declara em entrevista que: “Acho que a minha indicação é a expressão do
compromisso da nossa presidenta, do compromisso do governo federal com os
movimentos sociais, com uma parcela da população que apoia esse governo, que
está junto conosco, que é beneficiado pelas nossas políticas, de mostrar que o
Estado brasileiro incorpora sua diversidade também na forma como compõe o seu
primeiro escalão”.
Outro exemplo de como isso se dá
na prática é a própria criação do “Estatuto da Igualdade Racial”. Um processo
em que grande parte do movimento negro investiu esforços e que se mostrou um
grande golpe. No final de todo o processo de negociação, e depois de muita
disputa política, foi aprovado um estatuto que tinha um caráter autorizativo,
ou seja, um documento com normas não obrigatórias que não previa recursos para
a implementação de politicas afirmativas nem para seu monitoramento.
Esse Estatuto não pensa na
política mais importante pra nossa juventude negra que é o genocídio. Acho que
o fruto disso é o aumento da morte de nossos irmãos enquanto o índice de morte
da juventude branca diminui. Podemos dar outros exemplos como a não garantia da
titulação das terras quilombolas e etc.
Mas isso significa que não houve
avanço em nada no combate ao racismo?
A principal política desse
governo foram as ações afirmativas. É claro que houve algumas outras políticas
pontuais, mas ainda muito pequenas perto das expectativas dos negros com um
governo que seria dos trabalhadores e dos oprimidos. E é claro que esses
avanços não são frutos de bondade, mas são concessões que essa administração
teve que dar por conta da mobilização do movimento negro em conjunto com outros
movimentos sociais.
É como tirar os anéis para não
perder os dedos (no caso da burguesia). Não podemos deixar passar
desapercebidos que algumas das políticas do governo por conta da necessidade de
também responder a burguesia, auxiliaram com algumas aspas, negros e negras. Um
exemplo claro disso é o ProUni (Programa Universidade para Todos) e o FIES,
claras tentativas de salvar o bolso dos grandes empresários da educação
superior preenchendo as vagas ociosas em universidades particulares. Bom, isso
significa que o governo, ou mesmo os próprios estudantes através de
endividamento, pagam aos grandes marajás da educação pelas vagas, garantindo a
continuidade dos lucros exorbitantes dos grandes monopólios educacionais. O
resultado dessas politicas é o processo de crise que tem feito milhares terem
que abandonar seu sonho de terminar uma graduação, pois não conseguiram o
prosseguimento do financiamento.
Esse processo é um marco
importante na experiência do movimento negro com o parlamento, com o governo do
Partido dos Trabalhadores e com a própria democracia burguesa. Se aos primeiros
sinais da crise o governo federal já dá claros indícios de que lado vai ficar,
de qual será a importância dada à questão racial e como se dará a relação com
os trabalhadores e a juventude, nó precisamos unir forças para que seja
possível defender nossas conquistas, nos defender contra os ataques dos setores
conservadores e também do governo do Partido dos Trabalhadores.
Num momento de crise, o Estado,
balcão de negocio da burguesia, precisa trabalhar para garantir que os
capitalistas não tenham que pagar a conta. Para isso, alguém terá que pagar,
seja pela redução da maioridade penal, ou pelo aumento de impostos, ataque aos
direitos trabalhista, aumento da repressão e etc. Não podemos ter dúvidas,
somos nós os primeiros alvos e os mais atacados. Eles vão querer atingir a
partir de qualquer politica que com anos de luta conseguimos arrancar.
Nesse momento é preciso avançar,
de preferência a passos largos. Esse é o momento em que já é possível, e mais
do que isso, é extremamente necessário, fazer um balanço estratégico do que
significaram esses 12 anos de governo PT, desses 30 anos de “democracia” pós
ditadura, para que possamos avançar numa luta conseguinte contra o
racismo e para que não paguemos pela crise.
Precisamos construir no movimento
negro um polo de unidade que aglutine todos os setores antigovernistas para
combater os ataques, mas também para ter autonomia para levar a frente a defesa
das demandas do nosso povo. Para isso, é necessário organizar a luta em
conjunto com outros setores, colocando sempre em primeiro plano as necessidades
de negros e negras e principalmente impondo a discussão racial em todas as
lutas e em todos os espaços. O combate ao racismo deve sim ter como
protagonistas os negros organizados, mas é preciso colocar nossa luta na altura
de importância que ela tem.
É preciso que atuemos em todos os
lugares onde estejamos, seja nos locais de estudo, trabalho ou também de moradia,
e em todos de forma organizada. Precisamos colocar a nossa luta na ordem do
dia. A construção social e econômica do nosso país nos coloca uma importante
tarefa de responder as necessidades de nosso povo, já que é impossível uma
verdadeira transformação social sem nós, sem levar a sério a luta negra!
Somos um setor determinante na
luta de classes no país. Se é verdade que o que vivemos historicamente são
setores da esquerda e da direita usando as nossas pautas e atuando na busca
para cooptar nossos quadros, não por querer responder de forma consequente as
nossas demandas, mas sim para usar nossa mobilização e força como massa de
manobra, também é verdadeira a urgência de nos organizarmos.
Não estou querendo apagar a
história do movimento negro, mas é preciso sim fazer um balanço dos erros
históricos, superar ideias e vícios que não nos ajudaram a avançar e ver quais
ideias nos servem. Até porque, se o movimento negro não é homogêneo, sua
história também não é. O que levanto é a necessidade de avançar. A história não
espera, os ataques estão vindo, nossos irmãos estão morrendo, sendo presos,
demitidos e etc. O que iremos fazer?
Os caminhos só podem ser traçados
a partir de organização ou reorganização do movimento negro. As politicas
raciais do governo mostram que sem uma politica de independência de classe e de
autonomia, é impossível levar a frente nossas demandas que são inúmeras. Por
isso é urgente que nos organizemos e que façamos balanços e estratégias para
levar a frente nossa luta e principalmente para resistirmos a essa crise.
Tags: Questão
Racial · Marcela Johnson
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