A Luta Contra o Racismo Silencioso do Vale do Silício
Escrito por
Darold Cuba
10 July 2015 // 07:37 PM CET
 parte II



No decorrer das filmagens do documentário "Ser Negro na América: A Nova Terra Prometida: Vale do Silício", Williams passou meses andando pelas ruas de Mountain View, onde o número de pessoas não-caucaisanas é baixíssimo. Essa carência confirmou algumas estatística chocantes. Uma pesquisa conduzida pela CB Insights em 2010 revelou que apenas 1% das startups que haviam recebido patrocínios no começo daquele ano tinham ao menos um funcionário negro.

“Eu sabia que não existia muita gente negra na indústria, mas viver no Vale do Silício, centro dessa economia, e não ver ninguém parecido com você é uma experiência visceral", Williams contou ao The Root no ano passado.

Entretanto, Williams encontrou alguns sinais de esperança durante sua viagem. Foi durante suas andanças que ele conheceu Angela Benton, outra empresária negra, e a ajudou a lançar o novo programa NewMe Accelarator, uma "incubadora" para startups criadas por membros de minorias. O NewMe leva alguns empreendedores selecionados para uma casa no Vale do Silício e convida uma série de palestrantes para aconselhá-los e ajudá-los a tirar seus projetos do papel. O programa, que começou como um evento de um dia, já ajudou várias empresas a captar um total de US$16 milhões.

Essa experiência incitou uma discussão entre Williams e sua amiga, a filantropista e empresária da Filadélfia Shahara Ahmad-Lewellyn, sobre a importância de construir uma coligação de tecnólogos, empreeendedores, políticos e estudantes. Em 2013, eles arrecadaram fundos para um evento inaugural no MIT: a Conferência Platform. Nela, um grupo diversificado de convidados dariam palestras sobre suas próprias experiências; o grupo incluia Quincy Jones, a astronauta Mae Jamison, Deval Patrick, Lady Jane Forrester de Rothschild e Nicholas Negroponte.

Além da Platform, muitas outras organizações, empresas e iniciativas — corporativas, civis e não-lucrativas — foram criadas para diminuir a crescente disparidade na área tecnológica. Entre eles estão o #YesWeCode, o Code 2040, a Girls Who Code, a All Star Code, o Digital Undivided, a BUILDUP, a Black Girls Code, a Silicon Harlem’s Apps Youth Leadership Academy, a Latino Startup Alliance, a Black Founders, o Culture Shift Labs, e muitos outras iniciativas dispostas a resolver esse problema.

A ideia por trás da Platform, diz Ahmada-Llewellyn, é apresentar exemplos positivos e oferecer ferramentas práticas dentro do ramo das exatas — "ser ao mesmo tempo uma âncora e um trampolim para aqueles que irão enfrentar os desafios do mundo econômico". Na terceira convenção, que ocorre esse ano mais uma vez na Universidade Morehouse, em Atlanta, Williams e sua equipe planejam expandir o alcance do evento, incluindo mais convidados célebres (o diretor do Twitter, Jack Dorsey, e o vice-presidente sênior do Google, David Drummond, estão na lista) e, possivelmente, uma cobertura televisiva. “Estamos mudando a consciência nacional", disse Ahmad-Llewellyn.

 Crédito: Platform

Apesar de todo discurso de inclusão, liberalismo e "valores americanos" que existe dentro do Vale do Silício, há uma enorme disparidade entre os consumidores e usuários das plataformas de tecnologia do país e os funcionários, diretores e investidores que comandam essas plataformas. Negros e latinos representam ao menos 30% da população americana, e, segundo o último censo publicado, 49,5% das crianças menores de 5 anos do país pertencem a duas ou mais raças. Mas os números divulgados pelas maiores empresas do Vale no ano passado formam um cenário muito mais homogêneo.

Um exemplo: de acordo com as estatísticas divulgadas pelo Twitter em agosto do ano passado, seu quadro de funcionários é 2% negro, 4% latino e 30% feminino — números que se repetem, com algumas variações, em outras grandes empresas do setor. A diversidade do país é melhor representada pelos usuários do Twitter: o grupo é majoritariamente étnico; cerca de 27% dos negros da internet utilizam o Twitter, comparado A 21% dos brancos. A plataforma virou um centro de ativismo e debate sobre diversidade e justiça. 

“O movimento negro do Twitter é herdeiro do movimento negro dos anos 60", disse Keith Clinkscales, diretor da Revolt TV, uma empresa de comunicação fundada por Diddy que participou da última convenção da Platform. “É ele que traz notícias importantes para o público, como o caso de Trayvon Martin, Ferguson e outros. Ele força a grande mídia — e o grande público — a prestar atenção.”

As mídias sociais também estão ajudando a resolver o problema da diversidade dentro do ramo de tecnologia. Por muitos anos, as empresas mantiveram suas estatísticas em segredo. No ano passado, uma iniciativa apoiada por muitos, incluindo o líder do movimento negro Jesse Jackson — e também por uma campanha imensa no twitter — mudou isso. Em maio, as quatro maiores empresas de tecnologia do setor divulgaram suas estatísticas de funcionários — a primeira foi o Google, seguido pelo Yahoo, depois pelo Facebook e a Apple.

Outras grandes empresas de tecnologia foram cedendo aos poucos, conforme ativistas exigiam essas informações por meio de pedidos dentro do Ato de Liberdade de Informação (FOIA, no original) ao Departamento de Trabalho dos EUA. (Entre aqueles que não divulgaram seus números, de acordo com o OpenDiversityData.org, estão o IBM, o Hulu, o Netflix, e o Cloudera.) Os números não são nada empolgantes: a porcentagem de funcionários negros e latinos dentro das quatro maiores empresas varia entre 2 e 4%. (A Apple possui porcentagens um pouco maiores, mas a empresa também conta com o maior quadro de funcionários de todas as empresas avaliadas.)

Durante sua palestra na Platform de 2014, Jackson definiu os números como "deploráveis". "Essas estatísticas confirmam a exclusão de negros e latinos dentro da indústria, tanto em cargos técnicos quanto em outros cargos", disse. Jackson acrescentou que a falta de diversidade se repete na diretoria dessas empresas. De acordo com um estudo sobre a presença de minorias dentro das 20 maiores empresas de tecnologia, conduzida pela Rainbow PUSH Coalition, onze dessas 20 empresas — incluindo o Facebook, o Twitter, o Yahoo, o eBay e o Google — não possuem nenhum membro não-caucasiano em suas diretorias.
 continua...